João Wagner Galuzio,
véio, feio e fofo.
Caetano, o poeta veloso, sutilizou
e cantou em sua música Sampa, o drama de Narciso, o personagem da mitologia grega
que representa a vaidade exagerada. Suave, na música, ele explica o bairrismo entre
as duas grandes metrópoles, Rio e São Paulo. Até hoje, ainda é evidente vários
traços de ciúmes, invejas e picuinhas entre pessoas de cá e de lá, apesar de,
essencialmente sermos todos iguais na diversidade.
E, considerando que o bicho
humano é um ser gregário, é bastante comum que se estabeleçam laços fortes
entre aqueles que são próximos por afinidade, por semelhança, vizinhança, time
ou ideologia. Tem mimimi e nhenhenhém até entre os moradores de um condomínio,
entre um e outro bloco ou torre, entre classes nas escolas ou, entre a nossa
rua e a ‘rua de baixo’. Isso é comum, mas algumas vezes pode não ser muito
inteligente e civilizado.
Individualmente, é natural, gostoso,
saudável e necessário termos consciência de nossas qualidades, de algumas características
pessoais como aspectos físicos, intelectuais, culturais ou sociais. Esses
detalhes podem formar e destacar nossa identidade, um jeito de se reconhecer e
se sentir como indivíduo, único e especial. Este senso de autoestima é muito
importante para o nosso desenvolvimento emocional e afetivo.
Nós, gerontolescentes, que somos, jovens há várias décadas, aprendemos e sabemos que não há um modelo, o certo ou
o errado. Afinal somos únicos, não é mesmo!? Podemos dizer que não há, por
natureza, uma pessoa melhor ou pior, o feio ou o bonito. Essas classificações
são invenções de quem não se conhece, nem os seus próprios limites ou limitações
e, por isso, para se esconder, vulneráveis, aborrecem os outros. Hein? Como é
que é!? É sério! Muita truculência é sinal de impotência.
A estética, por exemplo, sem
ética e sem etiqueta é, em si mesma, a expressão da beleza oca, vazia. Eu preciso
perguntar: O que é e onde está a beleza? A sabedoria ancestral, evidente na moral
religiosa no judaísmo-cristianismo, no islamismo e no budismo já ensina, há milhares
de anos, que a beleza está no caráter paciente, humilde e gentil. O budismo,
inclusive, destaca que todo o sofrimento do ser humano é derivado da vaidade
que nos ofusca e nos afasta do mundo real. Como disse acima, a mitologia grega
quase debocha do narcisismo.
É comum, para o indivíduo que se
sente vazio, por desespero, se apegar à casca, ao que é exterior como um cargo,
um status, à fama. O deslumbramento e ostentação que não são nada além de uma espuma que entorpece. O fascínio desloca a própria felicidade para fora de nós, em
qualquer coisa que não a nossa própria identidade. Parece que precisamos de uma
‘marca’ para iludir e mascarar nossa insegurança e frustração. Erich Fromm, filósofo
e psicanalista alemão nos impôs um novo ‘enigma da esfinge’ quando interroga:
Ter ou ser? Não tem tênis, joia, carro, roupa, gadget ou perfume que preencha
esse vazio, esse buraco, esse desânimo e angústia.
Ter um rosto bonitinho ou um body
saradão não garantem uma mente leve e feliz. Xaveco de véio feio? Ha, ha, ha! Observe
como você pode encontrar pessoas humildes, ganhando pouco, que vivem em lugares
sem qualquer glamour, com pouca exposição social e, no entanto, são
insuportavelmente felizes. Gente simples que não se aguenta de tanta alegria e
satisfação de viver. Enquanto é possível encontrar gente com muitos recursos,
festejados e celebrados, com casas, carros e muita bajulação, mas com baixa
autoestima e mais baixo ainda nível de satisfação, solitários e infelizes. Compram
tudo e muito mais e nunca, nada é suficiente.
Ah tá! Os belos esbeltos vão me
lacrar ou cancelar. Isso é mesmo papo de véio feio. Sim e eles estarão muito
corretos. Idoso, fofinho ou gordinho (ão) e grisalho, sou a síntese ou, o
modelo do fora de moda. Sei que não sou e, não quero ser, o normal à moda. A moda tem esse nome porque, antes de
expressão de beleza ou de bom gosto, é um conceito básico de estatística para
classificar um valor específico como o mais
frequente em um determinado grupo ou conjunto.
Essa definição de moda é bacana
exatamente para mostrar que, ao contrário de algo distintivo, representa a
frequência mais comum, só isso, num determinado grupo. É distintivo apenas para
dizer que se repete mais, mas não é significa que tenha maior ou melhor
qualificação. Destaca aquilo, todo e qualquer traço em comum, por menos
razoável que seja. Deixe-se descobrir a delícia de ser único, imperfeito, com
nossos medos e desafios. Este é o caminho de todo indivíduo saudável e com autoestima.
Uma verruga, mancha, peso, altura, olhos, cabelo, orelhas tudo e cada detalhe pode
trazer angustia ou afirmação para as pessoas. Escolha ser feliz.
Não perceber ou entender isso é
um sintoma de desinteligência, de ignorância. Ignorância gera insegurança; Insegurança
gera medo; Medo gera aversão que gera arrogância que, gera ignorância. Entende
a armadilha? É uma ladainha que se completa e se repete num perverso círculo
vicioso virulento. Restam ou sobram ódio, mágoas e ressentimentos.
Ei, esquece, nem tente ‘esclarecer’
o infeliz infectado por esse vírus. Inseguro e infeliz poderá ficar mais revoltado
e você, querendo ajudar, pode acabar aumentando e acelerando o processo. Muito
pior, num clássico triangulo neurótico não é difícil o indivíduo nos envolver nesse
jogo ou armadilha e entrarmos na paranoia. Os ´narcisos' precisam de ajuda
profissional para encontrar o caminho da gentileza. Isso explica, em boa parte,
o comportamento, por exemplo, de muitos radicais, sejam eles de qualquer
orientação política, religiosa, futebolística etc.
Por último um pouco de cultura
nerd também ajuda. Lembro-me de ter assistido um episódio da série Jornada nas
Estrelas, lá nos anos 1970, que passava nos canais abertos de tv e, detalhe, só
existiam canais abertos. A tripulação da
Enterprise chegava a um planeta onde todos os habitantes usavam máscaras. Não
me lembro de outros detalhes, mas a imagem poderosa que gravei em minha mente
era o motivo porque usavam tais adereços.
Alerta de spoiler! Não ficava claro, no início, o motivo de usarem aquelas
mascaras até que, perto do final, vários indivíduos tiraram suas máscaras. Quem
assiste poderia imaginar que usassem por serem ‘feios’ ou por terem feridas, pústulas
ou cicatrizes horríveis. Que nada! Eram todos ‘lindos’, daqueles, tipo antigos
garotos-propaganda de margarina (propaganda eu disse! kkk). Os habitantes eram todos
loiros de olhos claros com a pele lisa e rosada. Então, qual era o problema? O
inferno é que eram todos sósias, corpos e rostos idênticos e isso era insuportável,
pois não lhes permitia ter identidade,
não se percebiam como indivíduos únicos.,
Idoso, eu já fui muito vaidoso,
de se achar o cara, o tal e acreditava ser infalível, 'triple A'. Depois, aprendi com Bertold Brecht que podia errar, mas errar sempre diferente. “Inteligência
não é não cometer erros, mas saber resolvê-los rapidamente.” Errar pode ser uma oportunidade
extraordinária para aprendermos. O preconceito é um erro que todos cometemos um
dia, é resultado de um laço forte por afinidade e, ou, um traço mais forte de
personalidade. Eu agradeço todos os dias a chance de aprender e crescer, para
tentar melhorar. Para isso, precisei aprender e saber perdoar. Quem? Os outros 'narcisos' que me afligiam? Não! A minha cega, vaidosa e ingênua inteligência. Descobri que a melhor ferramenta para realizar a beleza de eu ser humanao é usar o outro como espelho, funciona. Empatia! Experimente,
o que é diferente pode ser sensacional.