João Wagner Galuzio
Escrevedor e Cantador
Escrevedor e Cantador
BRASILIA, BRAZILAND OU
BRASILISTÃO?
O bicho 'sapiens' é um mamífero
gregário por natureza, desde quando vivíamos em bandos nas árvores, há milhões
de anos e, em tribos e clãs desde umas poucas centenas de milhares de anos.
Somos e nos tornamos todos mais viáveis, quanto mais e melhor soubermos viver
bem integrados uns com os outros.
A evolução humana experimenta e
alterna momentos de franca evolução, muitas vezes em função do ambiente, mais
ou menos adverso e hostil, que exige radical adaptação, em séries de mudanças
que levam a uma terminal revolução. Ou muda ou nada.
Ah, eu sei que sou dramático,
mas não sou exagerado. Se as mudanças são inerentes e inexoráveis ao nosso
desenvolvimento humano e marcam o compasso de nossa evolução, mudanças muito
intensas e bastantes vezes mais frequentes e aceleradas, por vezes 'atravessam
o samba' num sincopado que pode até levar à fibrilação do nosso frágil tecido
social ou nacional.
Vivemos uma revolução
sócio-econômica-filosófica-cultural-etcetera-e-tal, em grande parte estimulada
pela concomitante revolução tecnológica. Inovações técnicas e metodológicas vão
à frente num andamento prestíssimo [andamento veloz], enquanto nossos
comportamentos e costumes seguem 'larghissimo' [andamento muuuuito lento (sic)]. Uma
das consequências disso é uma confusão moral que não poupa nem mesmo algumas de
nossas mentes mais preparadas que, inteligentes, mas cartesianas, sucumbem a
esse hiato que não é essencialmente racional, mas passional.
Resultado dessa confusão, nossos
valores humanos, aqueles fundamentos que compõem, ao mesmo tempo, o alicerce e
o horizonte de nossa gente, são vilipendiados, para não dizer massacrados. Numa
fase anterior, já experimentávamos o que se convencionou chamar de 'inversão
de valores' que, já no Século XIX Ruy Barbosa denunciava:
“De tanto ver crescer a
injustiça, de tanto ver agigantar-se o poder nas mãos dos maus, o homem chega a
rir-se da honra, desanimar-se de justiça e ter vergonha de ser honesto. ”
Neste início de Século XXI,
tantas redes sociais virtuais, efêmeras e superficiais, vão se enroscando até quase rasgar a complexa malha
que forma uma nação, excluindo as diferenças, linhas diversas que deveriam
abrigar. Parece que vamos involuindo a um nível em que pouco se percebe a
inversão, pois parecem extintos os valores. Conectados, mas desintegrados,
somos indivíduos que enxergamos, reconhecemos e valorizamos cada vez mais
nossos próprios e exclusivos valores individuais. Vemos a nação se esmorecer em
grupos, comunidades ou corporações que, ou degringolam em movimentos sociais
'orwellianos' ou milícias xenófobas, que se reduzem a 'coletivos', expressão
que me parece bem adequada aos juntamentos de frações de interesses que buscam
uma conquista particular em "flash mobs" insanos.
Todos os povos, em todo planeta,
enfrentam ou já enfrentaram essas contradições, em maior ou menor grau, mas no
Brasil estamos às vésperas de rasgar o manto da consciência nacional, o que
poderá nos impor uma fatura impagável e implacável. Devemos, e não podemos
tardar, decidir nosso destino, o que desejamos para os nossos descendentes para
os séculos que virão. Qual tradição iremos adotar para realizar o nosso
'Brasilia'? Assim mesmo, masculino, sem acento, em latim: Brasil.
Na tradição da cultura
anglo-saxã, 'land' é o sufixo utilizado para designar a terra ou o lugar
próprio de um clã ou de uma tribo. England ou, ‘Ingla-terra’, é o território do
'anglos' ou, ingleses. Na Ásia, 'istão' é o equivalente sufixo nos idiomas
daquela região, para identificar a condição daquelas etnias 'que ficam ou se
estabelecem' num determinado território. Por isso, vemos lugares próprios dos
que são curdos, dos que são afegãos etc. denominados, respectivamente,
Curdistão, Afeganistão, entre outros.
O léxico romano também destaca
um sufixo [-ia] para indicar as pessoas de um lugar como pode-se encontrar
tantos exemplos na forma original, em alguns casos como -'Germânia', 'Hispânia'
e 'Brasília' ou, como em outros casos, o sufixo se mantém, veja-se Itália,
Suécia, Índia, Rússia e Croácia, entre centenas.
Então obstino. Nós brasileiros,
que país pretendemos para nossos filhos, qual é a nossa vocação? Que futuro
iremos preparar? Enquanto muitas nações, que superaram a barbaridade e hoje
demonstram algumas evidências de alto nível de civilidade seguem o modelo "land"
exatamente por saber valorizar a diversidade, de outro lado, tristemente,
muitos dos "istãos" parecem ter perdido a memória de um passado que,
quando não glorioso, fora muito sofisticado e vão retornando, orgulhosos e
determinados, quase à idade das cavernas, pois que em benefício de umas poucas
etnias, vociferam o que parece diferente.
O nosso 'Brasilia' (ratifico:
Brasil em latim) tem a oportunidade de escolher seu destino. Ou respeitamos e
valorizamos as nossas instituições e diferenças ao jeito "Braziland"
ou, se premiarmos as partes, as castas e as corporações de toda ordem política
ou profissional, iremos definhar e depauperar num dramático e inviável
"Brasilistão". A história é repleta de exemplos de nacionais que,
desejando salvar interesses de grupos, uns versus os outros, todos perderam.
Parece-me que não aprendemos. Eia pois, ouçamos a dolorosa sapiência histórica,
outrossim, vibrantes sofreremos a deliciosa ignorância retórica.
Sim, a sabedoria da história, com
azeda certeza é difícil, pois montar este “patchwork” social com matéria prima
tão excêntrica, é encargo para aqueles que, maduros, transaram seus valores
ancestrais e trançaram juntos seu futuro. A ignorância retórica é tão deliciosa
quanto ardilosa. É doce e suave o caminho daqueles que se encantam (e se
enganam) com a conversa gostosa dos que oferecem a seda lisa, fácil e suave,
desde que, imaculada seja sua ‘pós-verdade’, neologismo eufêmico para
estelionato intelectual, a falácia inefável.
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