João
Wagner Galuzio
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U |
ma
das mentes mais prodigiosas da história da humanidade, Descartes nos proporcionou
um legado incrível, o método. O pensar para o saber, esta qualidade tão fértil nunca mais
foi a mesma depois dele, se pouco ou muito afetada por suas ideias.
Método
é uma característica inexorável da natureza, em todo o universo, que desenvolve
e segue padrões desde sempre. O homo sapiens, observador, cada vez mais foi
entendendo essa dinâmica. Primeiro observando as estações, o sol, a lua, as
estrelas e todas as criaturas, percebeu que tudo tem sentido e direção, tudo se
sucede e constante evolução.
Renato
Descartes reconheceu a importância do método como alavanca do conhecimento
humano, não uma muleta e, jamais, o limite do nosso saber. Com a licença da
redundância, os métodos podem representar as estratégias mais ou menos
conscientes, mais ou menos elaboradas para se acelerar o nosso processo
evolutivo civilizatório. Renato sonhou uma ciência maiúscula e ideal, capaz
entender todos os fatos e eventos. Um sonho que, apesar de etéreo e lírico,
iluminou o modo muito objetivo do aprender conhecer.
Outra
mente gigante, Lavoisier, compreendendo aquelas leis (ou métodos) da natureza ‘lacrou’:
“Na natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma” ou, como as
tribos mais antigas na África já decretavam: “hatuna matata” ou, para dizer ‘sem
problema’, pois no final resta o equilíbrio, o padrão prevalece, o ciclo se
completa.
Em
seu discurso do método, por princípio, Descartes observa que o nosso jeito de
ser gente é muito sabido mas também pouco sábio. Todos nós temos a convicção de
sermos donos do bom senso e pensamos que somos todos donos das nossas certezas
e verdades. Na internet, os algoritmos, inocentes, levam a culpa e são
criticados como responsáveis pela nossa idiotização quando, na verdade, repetem
apenas os modelos operacionais de nossa inteligência cada vez mais fracional em
benefício da inteligência artificial. Esse desperdício da nossa inteligência
facilita e concentra ainda mais a nossa necessidade insaciável de dogmas e
paradigmas.
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certeza é um tesão e a sua compulsão, um
conjunto de múltiplos de prazeres intelectuais.
É sério! Elegante, o nosso amigo Descartes jamais seria assim literal
como eu, mas em essência estou apenas parafraseando. Portanto, o problema da
nossa era das incertezas, como diria Galbraith, não é a inteligência ser cada
vez mais artificial, mas o artifício da ignorância que usamos como subterfúgio para
o nosso delicioso e sedutor reducionismo lacrador.
Esta
redução não ocorre apenas, como é mais evidente, no âmbito da coisa política ou
das ciências em geral, mas é muito mais abrangente no nosso cotidiano familiar,
no trabalho e nas relações comerciais. Maltratamos nossos gigantes quando
generalizamos e banalizamos nossos relacionamentos. Trucidamos o legado deles
quando distorcemos dados e resultados, relatórios e balanços para realizar
lucros que escondem malfeitos onde ou pouco se perde ou pouco se ganha, mas no
fim tudo se transforma, em bônus.
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último e talvez mais grave, desprezamos a indispensável consciência da
complexidade humana e, ao mesmo tempo, a unicidade das coisas vivas ou não, das
coisas importantes ou irrelevantes, ou não e, para ‘caetanear’ ainda um pouco
mais negamos o que não é espelho. Negamos a nossa própria inteligência quando
nem sequer percebemos o estado das coisas e muito menos ainda, quando odiamos a
perspectiva do diferente.
A vaidade
da inteligência do nosso supremo bom senso, tudo solapa, numa sopa creme de ideias
rasas, frases prontas, memes maliciosos, slogans hilários, julgamentos
sarcásticos e adjetivos cruéis que tem a eficácia de negar Lavoisier e transforma
tudo em nada.
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