segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Vai-se ford (minúsculo deliberado).

 

Vai-se ford (minúsculo deliberado).

João Wagner Galuzio

Hoje, 11 de janeiro de 2021, a empresa Ford apresentou formalmente, ao mercado, fato relevante indicando o encerramento de todas as suas atividades produtivas no Brasil, desde já, mantendo apenas a sede administrativa para a América do Sul, seu centro tecnológico e declarou garantia de fornecimento de peças para os seus veículos. A produção será mantida e concentrada na Argentina, no Uruguai e em outros locais.

Eu entendo que seja uma decisão que irá causar muito grave e dramático impacto na vida de dezenas de milhares de funcionários diretos e indiretos, será também um ambiente nervoso para os proprietários de seus veículos que provavelmente perceberão uma rápida depreciação no valor de seus veículos usados ou seminovos. Além destas consequências importantes, no entanto, tenho algumas considerações...   

1ª) Nestes 100 anos de Brasil, a Ford fez parte de um oligopólio onde contavam apenas uns poucos players: Volkswagen, GM, Ford e, mais recentemente a FIAT a partir dos anos 1970. Período quando esse clube mandou e desmandou, como lhes aprouve, abusando de subsídios, financiamentos e facilidades como, por exemplo, o Draw Back. Esse mecanismo cambial permitiu que aquelas empresas enviassem para cá a sucata de suas plantas de veículos descontinuados em seus países de origem em condições bem vantajosas. Por décadas remeteram lucros extraordinários em detrimento do parque industrial nacional.

2ª) Com a modernização consequente aumento da competitividade do setor no mundo todo e, em particular no Brasil, com a chegada de várias outras montadoras da Europa e da Ásia, a gestão do negócio no Brasil ficou cada vez mais complexo, ainda mais e especialmente considerando a instabilidade que é essa palhaçada que virou o Mercosul;

3ª)  A hegemonia da indústria automotiva norte-americana veio se deteriorando em função da competitividade e inovação tecnológica e comercial internacional e, depois de 2008, quando a empresa se viu em maus lençóis e quase faliu naquela crise do subprime. Apenas não soçobrou por conta da intervenção salvadora do governo americano;

4ª)  Uma de suas maiores concessionárias, se não a maior parceira, vem concentrando sua estratégia no desenvolvimento da marca Chery... criando e instalação o parque fabril da CAOA/Chery com carros interessantes e competitivos; 

5ª) A FORD irá continuar com a administração e a área de desenvolvimento de novos produtos; A nota informa que os veículos FORD continuarão sendo oferecidos, aqueles produzidos na Argentina e no Uruguai e em outras praças;

6ª) Talvez seja oportuno lembrar que a Ford já vinha sem rumo no Brasil desde o início dos anos 1980 e que, depois, conseguiu uma sobrevida com a Autolatina, num acordo que se não estou enganado foi mais favorável para a empresa americana e menos para a empresa alemã.

7ª) Me parece ainda mais preocupante a recém anunciada fusão entre a FIAT e o grupo mantenedor das marcas PEUGEOT e CITROEN. Não me surpreenderá que esta fusão vá impor uma nova reestruturação global mais severa com repercussões por aqui, envolvendo mais fábricas, modelos e funcionários.

Outras duas possibilidades ainda podem decorrer... uma saudável e outra mais grave... a saudável... a Ford já estaria iniciando negociações para outras montadoras assumirem suas fábricas e parte dos funcionários. A pior notícia é que, com a Covid-19, outras montadoras possam estar avaliando suas estratégias.

Por último eu lamento, pessoalmente, que não tenhamos um Ministro das Relações Exteriores bem preparado e orientado para negócios internacionais. Decisões dessa natureza como a que a FORD tomou estão sendo engendradas a meses. Não é improvável que, enquanto o senhor Ernesto ficou fazendo beicinho para o eleito presidente americano, Joe Biden de um lado e, brincando de malmequer com a tecnologia 5G chinesa, que hoje já representa mais de 40% da infraestrutura brasileira de comunicação 4G, simultaneamente e pelas costas do governo brasileiro, a FORD estivesse em tratativas adiantadas com os nossos adversários do MERCOSUL.

Não me surpreenderia que o próprio Donald, antes de sua insurreição, tivesse privilegiado seu real amigo pessoal, o ex-presidente argentino Mauricio Macri. Não é improvável que, na conta do americano presidente pato manco e empresário desleal, tenha pesado o cálculo de seus prováveis negócios (campos de golfe e resorts) no território de nossos, mais uma vez, adversários do MERCOSUL

Como assim adversários do MERCOSUL?

Alguém tem que dizer para a Argentina, e isto vem desde o governo FHC inclusive, que um bloco econômico não é bloco hegemônico. Caramba, para não dizer obscenidades, toda vez é isso, a Argentina só leva vantagem. Humildade e reciprocidade dos ‘hermanos’, condições que são indispensáveis para qualquer casamento, relacionamento ou parceira é ZERO. Fordê, vai lá e fala para Argentina comprar os carros que ela produzir.

Produzir lá e vender aqui é fácil, seus carros não vão fazer falta nenhuma entre as inúmeras opções que temos por aqui. Quer vender aqui? Mantenha os empregos e instalações aqui, ou precisamos desenhar? Mais uma vez, querem produzir na Argentina para vender aqui? Não mesmo, na na ni na... tchau, vai-se ford (sic).

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